segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Avulsos 17: «Câmara Clara» sobre o auto-retrato e a auto-representação


















O programa Câmara Clara é um expositor vivo, uma interessante e inteligente forma de divulgação de obras da cultura portuguesa, na sua relação com as obras de culturas de carácter mais ou menos transnacional. A última sessão foi dedicada ao auto-retrato e à auto-representação, e contou com a presença de Jorge Molder, cuja obra foi já objecto de inúmeras leituras, com particular destaque para a de Delfim Sardo, no volume da editora Caminho que lhe é dedicado, bem com a presença de Paula Morão, cujo campo de investigação tem estado relacionado com aquilo a que chama «escritas do eu». Para além dessas presenças, pôde contar-se também com a intervenção de Bernardo Pinto de Almeida, autor a que já aqui fizemos várias vezes referência, neste blogue, e que é talvez o nome mais conhecido da teoria e da crítica das artes visuais entre nós, a propósito do auto-retrato em pintura (cuja origem, no que toca ao auto-retrato pintado como género independente e de pleno direito seria o de Las Meninas, de Velázquez).

De muito se falou: dos auto-retratos pintados de Bacon, Courbet, Cézanne, Gauguin, Van Gogh, James Ensor, Velázquez, Rembrandt, A. Dürer, Mário Dionísio (na Casa da Achada), Andy Warhol, ou dos (auto-)retratos literários de Carlos de Oliveira, Ruben A, Mário Dionísio, James Joyce, Samuel Beckett de entre outros, assim como da recusa de Cindy Sherman da necessária autorização da utilização das imagens de sua obra numa rubrica consagrada ao auto-retrato; da interessante ideia de Bernardo Pinto de Almeida de que o auto-retrato terá começado, como género independente, com Velázquez, e com a interrogação da crença na natureza divina do homem: o auto-retrato testemunharia e «produziria», assim, o homem como «existente»; de auto-representação e de violência (Bacon) ; do ensaio de Milan Kundera, sobre Bacon; das «situações de suspensão» presentes na obra de Jorge Molder e da irredutibilidade dos efeitos do tempo nas suas situações/personagens fotografadas; dos «programas operacionais», segundo a designação de Jorge Molder e dos «acontecimentos» da arte que determinam a sua alteração; da auto-confessada influência de Ana Hatherly na sua obra; de Manuel Gusmão, Maria Velho da Costa, Manuel Alegre; do Montaigne dos Essais, das Confissões de Santo Agostinho e de A Vida de Henri Brulard de Stendhal, para dizer que nenhuma «verdade» existe ou é veiculada nas obras relacionadas com «a escrita do eu». Vale a pena ver, com atenção. Nada melhor, por isso, do que ouvir e ver a gravação disponível no respectivo site:

http://camaraclara.rtp.pt/#/home/